A morte de um/a filho/a é muitas vezes descrita como sendo antinatura,
independentemente da idade do/a filho/a naquele momento ou da existência de uma
fratria.
Os pais experienciam um sofrimento dilacerante, extraordinariamente intenso – os/as
filhos/as são muitas vezes vistos como a continuidade dos pais, a sua projeção no
futuro.
Por isso, o processo de luto nestes casos é complexo, por vezes com o
desenvolvimento de manifestações menos comuns.
O acontecimento da perda de um filho pode, pois, arruinar o equilíbrio emocional e
oferece o grande risco do desenvolvimento de patologias do foro psiquiátrico.
Ainda que o processo de luto evolua linearmente, dentro das fases do ciclo de luto
(crise-desorganização-organização), algumas manifestações dolorosas, como a
tristeza, a culpa, a ansiedade e o medo podem permanecer para toda a vida; podem
tornar-se menos frequentes mas podem nunca desaparecer na sua totalidade.
Quando se está perante um luto relativo a uma criança, a sua morte ganha um outro
significado.
Em torno da criança foi feito um investimento – afetivo, familiar, social – que
agora é perdido.
Para os pais, é como se a idealização de felicidade e realização fosse
desestabilizado.
Com efeito, muitos casais não suportam o
desabamento sofrido nesta perda, acabando por separar-se, como se a perda
permanecesse entre eles.
Quando tal não sucede, é possível que ambos os pais desenvolvam estratégias de
sobrevivência conjunta – na sua individualidade – de modo a enfrentarem-na enquanto
casal.
Tal sucederá particularmente e mais rapidamente nos casos em que existem outros
filhos, aos quais é preciso dar atenção e acompanhar o processo de luto que
vivenciam pela perda de um/a irmão/irmã.
Diferente é a situação dos pais separados ou divorciados à data da morte da
criança.
Durante a Fase da Crise, geralmente mantêm-se próximos, sendo comum haver
manifestações de grande empatia entre ambos, como que “um reencontro” na perda do
filho comum.
Alguns chegam mesmo a tentar estabelecer uma nova relação conjugal, como se esta
pudesse recuperar os vínculos afetivos com o filho perdido.
Mais comum, no entanto, é haver entre ambos momentos de conflituosidade e
agressividade, que dependerão, em parte, da história da sua relação conjugal passada
e com a sua relação presente.
A atribuição de culpa da morte da criança ao que tinha sobre ela tutela direta é,
por muitas vezes, violenta.
Também é muito comum a responsabilização recíproca daquela perda – mais comum que
nos pais que estavam juntos, ou casados. O afrontamento pode originar, quer num,
quer noutro, danos psicológicos irreparáveis, complicando os seus processos de luto.
Importa, em todo este processo, salvaguardar e orientar os pais para o facto de que
o/a filho/a que perderam é insubstituível. Nenhum/a outro/a, quer já existente ou
não, pode ocupar o seu lugar.
No entanto, podem ocorrer comentários que inspiram nestes pais uma profunda dor e
que, a todo o custo, devem ser evitados:
- “Era pior se vos tivesse morrido um filho único”
- “Sempre têm outros filhos”
- “Tens de engravidar rápido para esqueceres o que se passou”
- “Quando tiveres outro bebé vai ser mais fácil”
O luto dos/as irmãos/irmãs da criança.
No processo de luto vivenciado pelos pais, não podem esquecer-se os/as
irmãos/irmãs, muitas vezes crianças pequenas ou adolescentes.
Com a perda do/a irmão/irmã, a criança ou o/a jovem espera dos pais que “arrumem”
devidamente os papéis e que a reorganização familiar se suceda.
Por vezes, os/as irmãos/irmãs sobrevivos/as podem ter menos atenção e receberem
menos cuidados, especialmente se as pessoas adultas estiverem a vivenciar um
processo de luto particularmente “não-normativo”.
Quando estas crianças são mais novas, os pais creem que então não são capazes de
compreender e lidar com a notícia da morte, fantasiando durante muito tempo, dizendo
que o/a irmão/irmã “foi fazer uma viagem” ou que “foi para uma escola muito longe
daqui”.
Estas histórias, para além de serem perniciosas por não corresponderem à verdade,
podem potenciar a ansiedade das crianças, já que o/a irmão/irmã não mais voltará.
Em relação aos outros filhos, os pais podem também assumir uma atitude de constante
vigilância.
O pavor de sofrer uma nova perda, com a morte de um segundo filho, pode levá-los a
uma proteção tão estreita que podem tornar-se asfixiadores da própria liberdade e do
saudável desenvolvimento das crianças.
Isto pode comprometer a vida social destes/as, sobretudo ao chegar à
adolescência.